17 maio, 2009

Bem mais que "simplesmente feliz"


(Da série: críticas pouco sérias)

Há momentos na vida para se ver "Simplesmente Feliz" (Happy-Go-Lucky, Inglaterra, 2008), o novo filme do diretor britânico Mike Leigh conhecido por, nas palavras do NY Times, suas representações de dramas inerentes à vida quotidiana de pessoas comuns.

Simplesmente feliz é exatamente isso: a narração dos altos e baixos (e médios, sobretudo dos médios) do dia-a-dia de uma pessoa que poderia ser eu, ou você. No caso, o recorte de alguns meses na vida de Pauline (Sally Hawkins) -ou Poppy, como ela gosta de ser chamada, uma professora primária de 30 anos que divide seu tempo livre entre conversas com as amigas, aulas de Flamenco ou trampolim e passeios de bicicleta pela cidade. Isso até o momento em que a bicicleta é roubada e os passeios se tornam aulas de auto-escola com o mal-humorado Scott (Eddie Marsan).

O mau-humor de Scott (e também de outros personagens menores) realça a atitude positiva de Poopy diante da vida, e é aí que se corre o risco de ser confundido pelo título do filme. Pauline é muito mais que uma Pollyana brincando, simplesmente feliz, do jogo do contente. Na verdade, Poopy, além de não se deixar afetar demasiadamente pelos contra-tempos da vida ("E a gente nem teve tempo de se despedir", é seu único comentário ao descobrir que a bicicleta foi roubada) sabe jogar com eles e revertê-los a seu favor, usando doses de sarcasmo e ironia que, embora quase imperceptíveis, corariam mesmo a Pollyana já moça.

E é com essa ironia diluida homeopaticamente em largas doses de bom-humor que Poopy vai enfrentando a vida e afetando os que a cercam, das amigas, aos alunos, ao Scott (cujo bordão "Enraha" - usado para simbolizar a função dos espelhos retrovisores - "eye of Ra" - é um dos pontos cômicos do longa).

Um ótimo filme com várias possibilidades de leitura. Diversão e reflexão garantidas desde que a regra básica de timing mencionada no primeiro parágrafo seja respeitada. Aliás, mais que momentos na vida, há estados de espírito necessários para se ver "Simplesmente Feliz". Em um mau momento, depois de levar bronca do chefe, brigar com a namorada ou ir mal naquela entrevista importante, é ele, seu estado de espírito, que determinará se Poopy é apenas uma chata "simplesmente irritante" ou uma professora excelente de uma das muitas mensagens do filme - a de que é preciso aprender a rir de si mesmo.

5 comentários:

Webeatriz disse...

Olha só, bem mais que simplesmente feliz , fico eu ao descobrir nesta manha de domingo, logo após a releitura do capítulo inicial da Filosofia da Ciência : introdução ao jogo e suas regras, (Rubens Alves) que um pobre tosco e sentimental amigo está de volta as Letras (talvez nunca tenha parado, eu é que não percebi).

O que me trouxe hj aqui? Talvez algum ascentral , se azande
eu for , aponte o responsável pela feitiçaria; mas fruto do acaso ou do ocaso, bom saber que vc. está de volta, bem mais que simplesmente feliz eu fico em te ler!

Rafa "Passarel" Borges disse...

Tchê, é a primeira vez que acesso teu blog, e com toda a prepotência que minha origem gaúcha me permite, já vou chegar discordando do título dele (se bem que nós sabemos que gaúcho não é prepotente, é realista :P)

De trás para a frente, até concordo com o sentimental (especialmente depois da terceira ou oitava Brahma, que só bebemos por causa daquela p...). Mas com o brilhantismo desta tua mente, a riqueza de tuas experiências e a grandeza do teu coração, acho que o rótulo 'tosco e pobre' não se encaixa tão bem assim.

Anyway, só passei para dizer que gostei muito do blog, e espero ainda nos encontrarmos em algum bolicho da vida para compartilhar mais uma meia dúzia de cervejas e causos.

Um forte abraço deste companheiro de trago e ciência

alimped disse...

Ainda não vi, nem sei se vai estar em cartaz ainda, mas desde que li a crítica do filme naquela revista de direita que eu assino, fiquei interessado em assistir. É que ultimamente estou mais para o instrutor de trânsito descrito na sinopse.

Qdo estou assim, todo mundo me parece irritantemente feliz. A irritação piora o meu humor, numa espiral para baixo. Quem sabe o filme não me ajuda a entender ou até admirar esse povo tão feliz enquanto está tudo tão ruim!

Danilo disse...

Nao, quero ver e ja to indo providenciar uma copia (whatever it takes, se vcs me entendem)...

Acima de tudo, fiquei muito feliz de re-econtrar o A. e seus pensamentos sempre tao profundos... Nao necessariamente no conteudo e na elaboracao (nao me entendam mal, isso nao eh uma critica, nem de longe, pelo contratio alias), mas profundos pela sinceridade et crueza (no bom sentido, de novo) dos sentimentos, que sempre me tocam e me fazem lembrar que, acima de tudo, da crise, do preco da carne, da lampada da cozinha queimada... que acima disso tudo, ainda sou humano e sinto... e isso eh motivo mais que suficiente para comemorar e se alegrar...

Valeu A. !!!! Meu dia ficou melhor depois de te ler !!!!!

A. disse...

Vânia, eu sumo e reapareço em milhares de blogues diferentes e v. dá um jeito de me achar. Eita azande bom de faro! (que bom!). :D

Passarel! Bah, tchê, como é que vai essa vida londrina ? Saudades de beber por aqueles motivos... :D Voltou pra aqueles pagos alguma vez ou já tá esquecendo o português - digo - o gauchês ? Forte e saudoso abraço!

Alimped, já nos conhecemos há suficientes anos pra saber que esse mau-humor é passageiro... Mas enquanto ele não passa, eu deveria aproveitar, nada melhor para um do que discutir com o outro (nosso esporte preferido - até onde eu consigo me lembrar) quando este está irritadiço! :D Vê se volta a escrever, estou com saudades dos seus textos!

Zazá! Assim v. me emociona e eu também coro como a tal Pollyana!